Mishpatim
é uma parte do estudo do Antigo Testamento que expressa a vontade de Deus em
construir uma sociedade humana, sobre os pilares da justiça e do que é correto.
"Porque eu o
tenho conhecido, e sei que ele há de ordenar a seus filhos e à sua casa depois
dele, para que guardem o caminho do Senhor, para agir com justiça [tzedaka] e
juízo [mishpat];" Gênesis 18:19
Assim,
o estudo de mishpatim se refere ao conhecimento das leis de Deus que foram
dadas ao homem para promover o reino de Sua justiça.
Maimônides, no seu livro Guide for the
Perplexed, afirma que mishpat tem um conceito
muito complexo. É algo que denota "em decidir em tomar certas atitudes em
concordância com misericórdia ou castigo".
Justiça,
na visão bíblica, raramente é estritamente ou rigidamente justiça. A justiça
Bíblica sempre vem acompanhada de compaixão e humanidade. Um grande exemplo
está no texto de Êxodo 23:5.
É
um pequeno mandamento, rápido, curto, mas ainda assim possui um significado de
longo alcance e profundidade, como também beleza moral admirável:
"Se vires o jumento,
daquele que te odeia, caído debaixo da sua carga, não te desviarás deles.
Certamente o ajudarás [תַּעֲזֹ֖ב taazab] a levantá-lo." Êxodo 23:5
Os Princípios do
Amor ao Próximo
Há
neste texto dois princípios sólidos no pensamento do mundo da fé concernente
aos conflitos do homem com seu semelhante. O primeiro é em relação ao bem do
animal e da natureza em geral, que proíbe o Tza'ar ba'alei
chayim - impor sofrimento
desnecessário sobre animais ou outras criaturas vivas.
O
segundo é ainda mais forte. Com efeito, o Êxodo está nos dizendo que o nosso
"potencial", ou "percebido" "inimigo" é, como você, um ser humano. O conflito, a
discordância, pode até dividí-los, porém há algo muito mais profundo que os
une: A solidariedade.
Necessidade
e dificuldade são elementos que podem transcender a linguagem das diferenças.
Não se pode deixar que o rancor ou a animosidade impeçam de irmos em socorro
daqueles que estão precisando de ajuda.
Se
alguém está com problemas, ajude. Não fique se perguntando se ele é amigo ou
não. Se envolva, assim como Moisés se envolveu quando viu que pastores da
região de Midiã estavam maltratando as filhas de Jetro.
"E o sacerdote de Midiã tinha
sete filhas, as quais vieram tirar água, e encheram os bebedouros, para dar de
beber ao rebanho de seu pai.
Então vieram os pastores, e expulsaram-nas dali; Moisés, porém, levantou-se e defendeu-as, e deu de beber ao rebanho." Êxodo 2:16-17
Então vieram os pastores, e expulsaram-nas dali; Moisés, porém, levantou-se e defendeu-as, e deu de beber ao rebanho." Êxodo 2:16-17
E
também como Abraão intercedeu pelos habitantes de Sodoma e Gomorra, quando tomou
ciência que seriam destruídos.
"Se porventura houver cinqüenta
justos na cidade, destruirás também, e não pouparás o lugar por causa dos
cinqüenta justos que estão dentro dela?" Gênesis 18:24
Há
muitas significâncias aqui. A primeira aparece do texto que contém um
mandamento semelhante, no livro de Deuteronômio:
"Se vires o jumento que é de teu
irmão, ou o seu boi, caídos no caminho, não te desviarás deles; sem falta o
ajudarás a levantá-los." Deuteronômio 22:4
Êxodo
trata de "inimigos", Deuteronômio de amigos.
Sobre
esses dois mandamentos, o Talmude declara:
"Se o animal de um amigo precisa
de ajuda, e o do seu "inimigo" também necessita, você deve primeiro
ajudar ao seu "inimigo"- para suprimir a inclinação para o mal".
Nestes
casos apresentados, certamente ambos precisam de ajuda. Mas no caso de um
suposto ou potencial "inimigo" nosso, há mais em jogo do que uma
simples ajuda a um animal em dificuldade.
Há
o desafio de superar as desavenças, distanciamento, e o sentimento doentio da
indiferença. Por isso a demanda por ajudar ao seu inimigo tem preferência, na
visão da Tradição Oral.
A
frase "não te desviarás deles" parece
supérflua, mas de fato não é. Ela destaca que quando vemos o nosso
"inimigo", a primeira reação que temos é de passar por ele, ignorando-o.
Assim, "não te desviarás deles" é
um mandamento para suprimir essa má inclinação natural do ser humano.
Ainda
mais interessante é analisar a frase "Certamente o ajudarás
[תַּעֲזֹ֖ב taazab] a levantá-lo".
A palavra "ajudarás",
aqui é תַּעֲזֹ֖ב taazab que
significa ajudar, e também significa"liberar", "desprender", "libertação".
De
forma que as traduções Aramaicas,
tomam este texto como "Certamente o liberarás", no sentido não somente do peso físico da carga
que leva, mas também certamente do desprendimento do rancor que há no coração,
em relação ao seu oponente.
Temos
não só que liberar o peso físico, como também o peso psicológico, a mágoa que
fere a sociedade dos dias atuais. Nós devemos perdoar os nossos inimigos, e
ajudar uns aos outros, para construirmos uma sociedade melhor.
É
por isso que esse verso do Êxodo diz para ajudarmos os nossos inimigos. Quando
o seu inimigo estiver com problemas, ajude-o. É o que a Torá está nos
ensinando. Desta forma, parte do rancor poderá ser dissipado.
Quem
sabe essa ajuda pode ser revertida em gratidão e consequentemente em amizade?
Esse é um modo prático de ir para além do conflito e construir um
relacionamento verdadeiro com nosso próximo.
Para
ser mais específico, a Bíblia tem mandamentos para não odiarmos os nossos
adversários.
"Não abominarás o edomeu, pois é
teu irmão; nem abominarás o egípcio, pois estrangeiro foste na sua terra."
Deuteronômio 23:7
Estes
dois, constituem o paradigma dos clássicos inimigos de Israel. Os Edomitas são os descendentes de Esaú, rival de Jacó.
Os Egípcios escravizaram os Israelitas, e ainda assim Deus afirma que é
proibido odiá-los.
E
é assim que é Mishpatim. Uma passagem que nos ensina a responsabilidade moral
de ajudar qualquer pessoa que esteja passando por dificuldade, não importando
qual seja o histórico de atitudes que essa pessoa possa ter tomado contra você.
Há
momentos em que temos que colocar as diferenças de lado, e ajudar uns aos
outros. As escrituras nos ensinam que mesmo pequenos e simples gestos de
cuidado, como a de ajudar um animal de um rival, podem transformar as relações
entre dois seres humanos.
Nós
temos que lembrar que um herói de verdade não é aquele que necessariamente
derrota o seu inimigo, mais é aquele que consegue converter seu
inimigo em um amigo.
"Mas a vós, que isto ouvis,
digo: Amai a vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam; Bendizei os que vos
maldizem, e orai pelos que vos caluniam." Lucas 6:27-28
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